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A Importância das Agências Reguladoras

Na década de 90, a necessidade crucial do ajuste fiscal, a menor polarização do debate político no país e a conjuntura internacional favorável impulsionaram um processo de privatizações e de desregulamentação de grandes dimensões na economia brasileira.

Mudanças no ambiente institucional foram necessárias para viabilizar um novo modelo de intervenção do Estado. Para tanto, criaram-se agências reguladoras tanto no âmbito federal como no estadual. Tais instituições foram montadas com relativa independência decisória e financeira visando contrapor a fragilidade das entidades de governos anteriores, marcadas pela forte interferência do executivo e dos próprios segmentos regulados e pela carência de recursos.

As agências reguladoras contemplam, na maioria dos casos, setores marcados por fortes economias de escala, alta intensidade de capital, longos prazos de maturação e ativos específicos com custos irrecuperáveis. Estas características determinam contextos onde a existência de um único concessionário minimiza os custos da prestação dos serviços, nesse sentido são exemplos: redes de distribuição de gás natural e transmissão de eletricidade. Tendo em vista o poder de mercado dos provedores, a regulação é necessária para evitar preços e lucros de monopólio.

O caráter irrecuperável de parte dos custos, por outro lado, deixa os concessionários vulneráveis à mudança ex-post da conduta regulatória. Ou seja, discrepâncias entre o acordado ex-ante e o realizado ex-post afetam significativamente as decisões de investimentos. O compromisso e a segurança jurídica, emanados dos dispositivos legais e das instituições, representam desta maneira, a garantia contra o oportunismo e a inconsistência temporal.

Uma das faces da desorganização da política energética do atual Governo Federal é o enfraquecimento e a captura das Agências Reguladoras. As agências passaram a funcionar como apêndices dos ministérios, perdendo seu mais relevante atributo: a independência. O governo nunca entendeu que as agências são órgãos de Estado e não do governo de plantão. Os resultados dessa postura do Governo Federal em relação às agências são conhecidos.

No setor de petróleo, depois do anúncio do pré-sal, o governo resolveu que o modelo de concessão não atendia mais a nova realidade do setor. Diante disso, em 2010 o Congresso aprovou o modelo de partilha e o setor de petróleo passou a conviver com dois modelos jurídicos. O problema é que a verdadeira razão de best online casino se implantar o modelo da partilha, não foi o critério técnico e sim o político. O modelo da concessão cumpriu seu papel, atraindo um grande número de empresas privadas para os leilões e tinha totais condições de atender o pré-sal. Na realidade, o pré-sal se constituiu no elemento que o governo precisava para fechar o mercado brasileiro, voltando a se utilizar da bandeira “O Petróleo é Nosso” e, com isso, politizando as decisões do setor.

No setor de energia de elétrica, o critério político e populista prevaleceu na criação da Lei 12783, que pode ser considerada a terceira mudança no marco regulatório do setor elétrico desde 1995, o que por si só já introduz um elevado nível de incertezas para os agentes do setor. A medida anunciada de forma autoritária e unilateral condicionou a renovação das concessões de energia ao aceite de condições impostas pelo Ministério de Minas e Energia e pela Aneel, sem que houvesse qualquer tipo de discussão prévia. Com isso, foram definidas tarifas e indenizações por ativos amortizados muito aquém do esperado pelo mercado, causando enormes perdas nos valores das empresas e proporcionando grandes prejuízos aos acionistas.

Os desmandos e as inseguranças geradas pelos governos mostram que nossas principais autoridades governamentais não entendem ou não querem entender que a concessão é do Estado e quanto melhor for a atuação dos concessionários maiores benefícios terão os usuários e maior valor terá as empresas concessionárias, que ao final da concessão pertencem ao Estados e a União.

Enquanto esse processo de captura das Agências Reguladoras ocorria no âmbito do Governo Federal, no Estado de São Paulo elas continuaram independentes e ativas. Tal fato contribuiu para a melhoria dos serviços públicos destinados à população e para a atração de investimentos ao estado, em particular no que se refere à distribuição de gás natural que é, de acordo com a Constituição Brasileira, uma responsabilidade dos Estados.

Apesar desses avanços, ainda há muito a se fazer e a Arsesp precisa dar prosseguimento a uma regulação que universalize o consumo de gás natural em São Paulo. É preciso entender que a maturidade e a penetração do gás são menores que as dos setores de saneamento e energia elétrica. E, por conta disso, o setor de gás requer maiores investimentos, até mesmo para atender as pretensões dos planos de desenvolvimento energético do estado, com as quais as concessionárias estão alinhadas em seus planos de expansão agressivos e sustentáveis.

Além disso, a concessão de gás natural é um exemplo raro e, talvez, o único no mundo que não possui monopólio absoluto. Pelo contrário, a concessão de gás sofre demasiado com a concorrência de combustíveis que tem seus preços controlados pelo Governo Federal como a gasolina, o GLP e a eletricidade. Por tal razão, é fundamental que a rentabilidade do setor esteja aderente às condições adversárias do mercado e ao apetite de expansão e universalização das concessionárias.

A exemplo do que se tem visto em outros setores e países, a modicidade tarifária à qualquer custo representa a destruição do patrimônio do estado e do setor econômico. Tarifas artificialmente determinadas e que não representam as reais necessidades de investimento e operação das concessões levam à deterioração dos serviços e da infraestrutura do estado de São Paulo. É sempre bom lembrar, que as áreas de concessão de distribuição de gás natural consistem em patrimônio da sociedade paulista e que, portanto, devem ser preservadas.

Por conseguinte, qualquer revisão tarifária deve primar pela técnica, lembrando que a principal função do órgão regulador é manter o equilíbrio entre sociedade, poder concedente e concessionária. Essa tem sido a tradição da Arsesp e, por isso, a agência paulista é benchmarket no Brasil.

Adriano Pires é Diretor do Centro Brasileiro de Infra Estrutura (CBIE)

Adriano Pires

Por Adriano Pires

Economista formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro; Mestre em planejamento energético pela Coordenação de Pós-graduação em Engenharia - COPPE/UFRJ e Doutor em economia industrial pela Universidade Paris XIII. A sua última experiência no governo foi na Agência Nacional de Petróleo – ANP onde atuou como Assessor do Diretor-Geral (2001), Superintendente de Importação e Exportação de petróleo, seus derivados e gás natural (abril/1998 a novembro/1998) e Superintendente de Abastecimento (dezembro/1998 a agosto/1999). Na Universidade Federal do Rio de Janeiro, exerceu a função de professor, pesquisador e consultor junto a empresas e entidades internacionais. Desenvolveu atividades de pesquisa e ensino nas áreas de economia da regulação; economia da infra-estrutura; aspectos legais e institucionais da concessão dos serviços públicos e tarifas públicas. É sócio-fundador do CBIE - Centro Brasileiro de Infra Estrutura atuando como consultor de empresas privadas no setor de energia elétrica, petróleo, gás natural e biocombustíveis.